terça-feira, 14 de junho de 2011

Tá pensando que é fácil, dizer "eu te amo"?


Não é nada fácil dizer "eu te amo" por 20 anos seguidos. É necessário um pouco de sorte e crença no impossível. Passado tanto tempo, há que se buscar num mundo de trocentas complicações, um segundo que seja pra pensar na pessoa amada, e afastando do pensamento todos os adendos do dia à dia, vê-la como a mais prazerosa das vontades. Acenda uma vela pra São José dos Amores Eternos e reze para que mesmo depois daquele desastroso primeiro jantar, quando você não fazia idéia que era necessário limpar um peito de peru antes de colocá-lo no microondas, ela decida seguir em frente.

Não é simples dizer "eu te amo" por 20 anos seguidos. É preciso paciência para compreender que o amor é maior que todos os atropelos da vida doméstica. Afinal de contas, eu planejei com minúncias de detalhes toda a operação pra levar o Bernardo numa festa na MI do Lago Norte, na casa de amigos novos que nunca tínhamos visto na vida e depois comparecer com os gêmeos numa festa junina no Park Away, encontrar os amigos que tanto nos divertem e de olho no relógio cronometrar o tempo de retorno porque a festa do Bê acabava à meia-noite e não era legal deixá-lo esperando, tudo isso na véspera do dia dos namorados.

Não é banal dizer "eu te amo" por 20 anos seguidos. É uma arte quase oriental compreender que os planos de um dia inteiro juntos pode ser destruído por um sono incontrolável de quase 12 horas, descanso merecido de quem teve que colocar no ar uma campanha que a "clienta" resolveu pedir de última hora com entrega necessária pra penúltima. E como era uma coisa quase impossível, a pessoa foi lá e fez. E aí, ajuda pra caramba morrer de orgulho pela melhor profissional do mercado que dorme comigo. Dorme muito, mas é comigo!

Não é comum dizer "eu te amo" por 20 anos seguidos. Há que se buscar sabedoria nos manuais do entendimento humano pra desejar a mesma mulher por tanto tempo e esperar mais uns minutinhos porque agora é hora de montar não apenas um, mais dois sistemas digestórios que as crianças tem que levar pra escola na segunda-feira, mas só lembraram de avisar no domingo à tarde. E santa criatividade, em pouco tempo, tava lá o produto feito com papel crepom, canudos de plástico e caroços de feijão.

Não é corriqueiro dizer "eu te amo" por 20 anos seguidos. Há de se pensar no outro como a mais perfeita concepção de todos os seus desejos de adolescência, mesmo quando a adolescência já tiver bem distante. Ou não! Porquê o primeiro grande fruto deste amor está vivendo plenamente a mesma e resolveu achar normal ficar em recuperação em apenas 10 matérias e quando depois de uma semana quase sem se ver porque trabalha-se em média 12 horas por dia, é preciso conversar com o garoto pra saber as razões dele não ter conseguido recuperar nenhuma das mesmas e traçar um plano de ação para ajudá-lo nessa dificílima empreitada que é fazer uma única coisa na vida, tudo isso com ele achando um tédio aquele papo interminável de pais caretas que não entendem que ele só quer curtir a vida.

Não é trivial dizer "eu te amo" por 20 anos seguidos. Temos sempre que buscar palavras bonitas pra traduzir esse amor e também para discutir onde será feita, e de que forma, a fisioterapia do filho que esmurrou uma janela de vidro achando que não ia dar e nada e deu em quarenta pontos internos, várias consultas ao ortopedista para acompanhar a recuperação e uma cicatriz gigante em forma de raio no antebraço esquerdo. Não vamos esquecer também que em decorrência deste fato, o filho amado ficou três semanas sem escrever e agora precisa ajuda pra recuperar o tempo perdido e a nota de história que o deixou em recuperação.

Não é tão natural dizer "eu te amo" por 20 anos seguidos. Há que se arrancar do baú de horas inesgotáveis, um tempo pra dividir sem pressa, entre viagens semanais, celulares que tocam o tempo todo, o mba que eu resolvi fazer nem sei porque, as reuniões na escola, as reposições de aulas particulares, o treino na academia, o campeonato de futebol do filho mais novo, a apresentação de bateria e o filme novo da Disney que estreou.

Não digo que eu seja um cara normal. Dizer "eu te amo" 20 anos seguidos, não é pra qualquer um, meus amigos. Entender que as lógicas são diversas, que cada um tem um jeito diferente de expressar o seu amor e que isso é o que mais encanta e renova tanto tempo de felicidade é uma tarefa hérculea para um macho alfa. Quando ainda por cima, carrega-se no temperamento e tatua-se no braço a dramaticidade de um escorpiano típico que não admite ser contrariado, aí é cruel. Pensa-se em largar tudo e buscar alguém que o ame de verdade e que seja merecedor do mesmo amor. Aí pensa-se mais um pouco tentando imaginar onde encontrar outra pessoa mais maluca do universo que preencha, que complete, que orgulhe, que entre no restaurante mais chique da cidade de calça jeans e tênis all star, como se estivesse vestindo um legítimo Carlos Miele e calçando um Louboutin e te deixe extasiado diante de tanta autenticidade e beleza, e...desiste-se...mais fácil tentar a mega-sena!

Não tem receita. Ou ela está justamente nessas vibes distintas. Nesta vida louca vida que levamos juntos e não deixa tempo pra coisinhas pequenas e melindres. Nesta incongruência de comportamentos e visões opostas que se encontram na esquina da sensatez com a maturidade. São duas batidas absolutamente díspares que a gente mixa com a arte de um grande DJ e anima essa nossa longa e doida festa batizada de vida em comum!

7 comentários:

gina disse...

Concordo, é dificil de acontecer, mas quando acontece não dá pra cansar de dizer. E nem cansa de ouvir essa pequena frase.

Tila disse...

Queridos Marquinhos e Renata, não sei se é fácil ou difícil... mas imagino. Eu nunca vivi uma estória como a de vocês, e me deleito com a de vocês, porque acho linda a forma como a vivem!!! Acho linda a felicidade que exalam, e, se isso é difícil, vocês fazem parecer que é fácil! Amei o dia dos namorados de 2011. Muito embora estivesse sem namorado, amei saber que vocês comemoram tão lindamente esse dia, há 20 anos, todos os dias! Obrigada por me mostrarem que o amor existe sim, e que sim, é possível, e que aim, é lindo! beijos,
Tila

Monaliza disse...

Marcus,
você é definitivamente um espécime muito rara de homem! E a Renata, uma criatura espetacular...Orgulho de poder ser testemunha ocular desse amor lindo, de mais de 20 anos.

Muitos beijos aos dois. E a vontade louca de poder aprender algo das suas lindas lições.

Mona

Tati Buratti disse...

Marcus, que texto lindo!! Me deixou emocionada...
Parabéns aos dois, por tanto amor.
Bjs!

Daniella disse...

Tá, não é fácil, mas você conseguiu amigo. Conseguiu, consegue, conseguirá. Esse é você porque ela é a Renata! Adorei!

Talitinha disse...

Adorei Marquinhos!
Excelente reflexão para quem ainda tem 17 anos pela frente para poder dizer se é difícil ou não dizer "eu te amo" depois de 20 anos de casamento.

Flizam disse...

Marcus, passei por aqui e antes de terminar o primeiro texto já comecei a seguir. Belo texto. Obrigado por dividir o texto sobre o Bernardo lá no meu blog. Deixei um recado lá também. Um abraço, Fábio